A Morte
A vida é permeada por mistérios, dos quais o nascimento e a morte são os mais inescapáveis. Enquanto o nascimento é celebrado com alegria, a morte é encarada como um evento trágico e melancólico, embora algumas crenças religiosas, como a cristã, defendam a ressurreição da alma. No Parque Nacional Peneda Gerês, em Portugal, os rituais da morte são profundamente enraizados na tradição católica, criando um protocolo rígido para expressar a dor da família enlutada perante a sociedade.
No entanto, também nesta região, vagueiam ainda lendas ancestrais associadas à morte como o Acompanhamento e a Berrega.
O Preto
A cor preta, símbolo de luto, era universalmente adotada por homens, mulheres e crianças, sem uma origem específica. O preto na ciência representa a ausência de luz e cor, sendo assim representativo da ausência de felicidade. Durante o período de luto, as demonstrações de alegria, como o uso de joias e ouro, eram abandonadas, e um esforço notável era feito para cumprir o luto adequado pela perda de um ente querido. Casamentos eram adiados, atividades festivas eram suspensas, e a matança de animais era evitada até que o tempo de luto fechado passasse, quando começava a transição para um luto mais leve, que podia se estender por até dois anos.
O Passamento
O anúncio de uma morte ocorria tradicionalmente pelo toque do sino da igreja, conhecido como "dobrar", e, em tempos mais modernos, por alto-falantes que informavam a comunidade sobre a pessoa falecida e os detalhes das celebrações fúnebres. No que diz respeito ao velório, a tradição indicava que a maioria dos defuntos não era levada para a igreja, mas sim velada em casa. Durante esse período, a casa era desprovida de decorações e até mesmo o relógio era removido para evitar o som do pêndulo. Móveis eram retirados, cadeiras eram emprestadas pela vizinhança, e até a água dos cântaros e os enchidos nas chaminés eram removidos.
O Velório
A prática do velatório ou velório, que é a vigília ao lado do caixão, nomeadamente o ato de velar ou vigiar, teve origem no facto de terem sido enterradas pessoas vivas, justificado por arranhões nas tampas no interior do caixão, o que indicava que o homem morto, de fato, tinha sido enterrado vivo. Tal fenómeno ocorria devido uso de xícaras de lata para beber cerveja ou uísque, em que, essa combinação, às vezes, deixava o indivíduo em uma espécie de coma induzida pela mistura de bebida alcoólica com óxido de estanho, acidentalmente simulando a morte. Assim, ao fechar o caixão, surgiu a ideia de amarrar ao pulso do defunto um sino (campana) através de um cordel. Depois do enterro, alguém ficava de serviço perto da sepultura por alguns dias. Se o indivíduo acordasse, o movimento do seu braço faria soar o sino. Tal fenómeno está na origem do atual nome das campas (estrutura de pedra) que se coloca nos cemitérios.
as flores tem um significado. Apesar de nos dias de hoje representarem um ato simbólico de afeto, em outros tempos eram usadas para disfarçar o cheiro.
O Vestuário
O corpo do falecido era cuidadosamente arranjado, vestido com a melhor roupa, muitas vezes escolhida antecipadamente, e colocado sobre a cama. Os rituais de luto envolviam expressões profundas de dor, com choros intensos, elogios ao falecido e lamentações pela sorte. Tradicionalmente, essa tarefa era desempenhada por mulheres da família, mas em alguns casos, carpideiras eram contratadas para expressar o pesar da família enlutada. Para crianças falecidas, especialmente meninas, os rituais eram adaptados. Os corpos das crianças eram colocados em urnas brancas e levados ao cemitério por crianças mais velhas (a cruzada). Em caso de uma jovem donzela, ela era vestida como noiva, completa com uma grinalda. A missa de sétimo dia, uma tradição católica, estava associada ao luto de sete dias, fazendo referência a passagens bíblicas que destacam essa prática. As mulheres, por luto, vestiam-se de preto, cobrindo quase completamente o rosto, sendo socialmente mal vistas aquelas que não seguiam essa tradição, considerada um sinal de respeito quase religioso.
O Dia a Dia
A influência dos rituais de luto na região também se estende ao traje, como o Traje Escuro ou Dó, usado pelas viúvas dos vivos para simbolizar a dor pela separação causada pela ausência temporária ou permanente de um ente querido. A cor preta predominante nesse traje reflete a tonalidade associada ao luto.
Assim, no Parque Nacional Peneda Gerês, a tradição católica entrelaça-se com a cultura local, moldando os rituais da morte e do luto de maneiras que respeitam e honram a vida quem se foi, enquanto oferecem consolo àqueles que permanecem.